Texto de Fabiana Pedroni.
Apontamento III, p.28, 19.01.2013
“Hoje o mar está bravo. Talvez amanhã”. Todos os encontros foram diferentes. O limite do corpo-cidade acompanha o ritmo, por mais que seja ignorado. Já me disseram da experiência de pessoas costeiras que se instalaram longe do mar e ficaram desnorteadas. “Quando ficamos perdidos na cidade não podemos mais dizer que é só ir em direção ao mar. O limite se afasta e criamos novos pontos”. A percepção de um corpo se dá por seus limites…
Ando aficionada pelos limites. “Todos os períodos revolucionários começaram, tentando forçar as fronteiras artísticas, depois se estendem às fronteiras sociais mais decisivas para a vida, até que, perto do fim do período, toda a sociedade se transforma” (Danto. Andy Warhol, Cosac Naify, 2012, p.53). Talvez o limite seja comportamental e não da ordem da visão. Há séculos sabemos que aquilo não é um abismo; por mais que sugue nosso olhar. Quem, dentro os habitantes litorâneos, nunca ouviu a expressão “não vamos pela rua da praia porque hoje estou com pressa”? Palavras e comportamentos. As delimitações são construídas pelos significados imputados pelo sujeito.
Mas se o mundo se apossa de nós porque nós nos apossamos do mundo em pequenas partes, como dar conta de algo tão imenso?
Então eu o vigiei. Semana após semana… a fragmentação se tornou visível ao fechar os olhos. Qual mar-limite eu penso? O enquadramento como imagem técnica o absorveu e fez respirar. Não é mais um palco, nem apenas parte da cidade como entorno. Agora ele é meu corpo próprio, cheio de imposições e sentidos.
“Quando eu for embora vou sentir saudades do mar” – concretizado como meu pormenor possessivo. Não me bastou saber que ele existia (o mapa já me dizia isso). Foi preciso um pouco mais de intimidade e posse para tê-lo comigo (novas cartografias). Questionaram-me sobre o que afinal significava a união arte-vida tão discutida desde a década de 1960. Bom, para mim é contaminação.
O mar é um contraponto de firmeza; nítido e disforme feito o ar, ele se revolve contido, parece querer escapar e testar minhas fronteiras como a poeira que se acumula por dias e dias de janelas abertas. Tudo que se move acarreta vontade, mesmo que não possa ser objetivado. Uma fronteira que lhe impõe a consciência de ser passagem, que quer levar e estacar jamais se apresentando como um igual. Mais do que algo no mundo, arte-vida necessita de contar e embarcar em um mundo: terra para mar.

Fotografia de nuvem de tempestade chegando do mar, com linha do horizonte escurecida e raios do sol descendo sobre o mar, com detalhe de refletores de um poste de iluminação no canto inferior esquerdo.
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