
Imagem de capa. Fotografia de Lucas Zimmermann, da série “Luzes de trânsito”, de 2015. Dois semáforos acesos, de costas para quem observa, sobre uma rua asfaltada, de noite. Tanto o semáforo verde de uma posta quanto o vermelho de outra pista estão acesos. Do outro lado da rua, o sinal vermelho de pedestres também está aceso. Parte da rua está bem iluminada pelo farol verde, à esquerda. O resto da imagem cai na escuridão.
Transcrição do podcast NPC 40: Como não enterrar lâmpadas acesas
Texto de Rodrigo Hipólito
Apresentação
E aí, gente perdida? Tá começando mais um Não Pod Chorar. Eu sou Rodrigo Hipólito e este é um derivado do Não Pod Tocar. Aqui, nós contamos algumas desventuras da vida e tentamos pensar em modos criativos de lidar com elas.
Se você chegou aqui agora e não conhecia o Não Pod Tocar, este é um podcast sobre teoria, história, crítica de arte e temas afins. No nosso feed, você encontra, além dos episódios do Não Pod Chorar, os nossos programas de temporada, com ensaios, entrevistas e bate-papo, e o Pataquadas, no qual a Alana de Oliveira repercute as principais notícias do mundinho da arte, com colunas abertas de Dennis Almeida e Camila Saloto.
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É isso, dados esses recados iniciais, neste episódio, você vai ouvir algumas reflexões sobre como não enterrar lâmpadas acesas.
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Tem uma coisa meio desagradável e constrangedora que acontece comigo de vez em quando. Não é só comigo. Eu sei que isso é bem comum com quem escreve e pesquisa, principalmente em áreas criativas. Provavelmente, isso acontece em outras áreas também, mas deve ser diferente.
Recentemente, eu comecei a ler um livro super bem recomendado. O título é “Nossa parte de noite”, da argentina Mariana Enríquez. Não é um livro ruim, mas não pegou, até agora. Tudo bem, eu não cheguei nem na metade do livro. A escrita é ótima, a história é interessante. As personagens, por outro lado, não encontraram um lugar à mesa, pra se sentar, na minha memória.
Sò que, não é disso que eu queria falar. Essa parte é só uma reclamação boba, porque eu queria estar gostando muito desse livro. O que eu queria falar era a respeito de outro tipo de frustração.
Desculpa se parece que tô fazendo suspense. Não é isso. Acontece que eu não sei muito bem como sintetizar essa frustração em uma frase simples, que pudesse anunciar a temática deste episódio. Então, eu vou falar dessa experiência em específico.
Esse livro, “Nossa parte de noite”, é de 2019. É um livro recente e que continua a fazer bastante sucesso.
Lá pro meio da primeira parte do livro, a Mariana Enríquez usa a expressão “Outro Lugar”, com as duas palavras escritas com iniciais maiúsculas. Ela tá falando de mundos sobrenaturais e de como o além vida é segmentado, ao ponto de não dar pra saber ou se comunicar com todos os lugares possíveis em que uma pessoa possa estar depois que morre. Ao menos, é assim que me parece até o ponto em que eu li. Não sei se a história muda muito depois disso. Eu espero descobrir até o final do ano, caso eu consiga acelerar um pouco mais essa leitura. Eu não vou negar, tá meio arrastado e eu tô insistindo por conta das recomendações de pessoas em quem eu confio muito quando o assunto é literatura.
Mas, deixa isso de lado. Volta na parte da expressão “Outro Lugar”. Quando eu li isso, eu abaixei o livro e fiquei meio triste.
Acontece que essa é exatamente a expressão que eu decidi usar em várias histórias que eu escrevo desde, sei lá, 2002. Aí veio aquela frustração que muita gente conhece. É como se, diante dessa situação, a gente automaticamente dissesse: “Poxa, agora, quando eu publicar alguma história com essa expressão, vão achar que eu copiei dela.”
Eu acho isso meio constrangedor, meio infantil, bobo e muito prepotente. Mas, é algo muito comum.
A gente tem uma ideia que parece boa e guarda essa ideia por diversas razões. Pode ser porque não há meios para levar aquilo ao público naquele momento; pode ser porque a gente quer tornar aquilo público de uma maneira que o nosso trabalho seja mais valorizado; pode ser porque a gente acha que produziu uma pérola e só deve mostrá-la ao mundo em alguma ocasião especial.
Esse último caso, é o que me causa constrangimento. E eu fico constrangido porque, eu faço isso de vez em quando. Hoje, com bem menos frequência do que eu fazia dez ou vinte anos atrás. Acho que eu melhorei um pouquinho. Vou me dar esse crédito.
Mas, eu ainda faço isso de vez em quando. Tenho uma ideia, uso uma expressão, e acho que aquilo é bom demais pra só publicar no site ou lançar um episódio de podcast, ou colocar em um artigo, e por aí vai.
Eu tento me vigiar, porque isso é besteira.
Primeiro, que dificilmente você será a primeira pessoa a ter escrito ou pensado essa suposta pérola. Você pode até não ter referências suficientes pra já ter se deparado com alguma obra que fez isso antes. Mas, eu te garanto que elas existem. Além disso, se você tem medo de colocar no mundo algo que te parece muito bom e aquilo ficar perdido no mar de informações, imagine que muita gente já jogou a ideia nesse mar e ela tá lá, perdida.
Segundo, que as suas ideias não surgem do nada. Quando eu paro pra pensar nesse caso, em específico, não só me podem me vir à cabeça outras obras que usam o termo que a autora usou, como eu sei que eu mesmo coloquei o termo no papel porque li ou assisti em outro lugar. Até porque, nesse caso, são palavras simples. Palavras não são especiais. O uso que nós fazemos delas é que as torna mais ou menos interessantes. Dentro de uma história de ficção, você não precisa sair inventando idiomas ou empilhando consoantes para criar palavras que pareçam especiais. Termos do cotidiano, quando são inseridos em situações bem construídas, se tornam muito mais potentes do que tentativas inocentes de inventar palavras sem histórias próprias.
E terceiro, se a o que tiver de interessante no seu trabalho perder a força por conta de termos que outras pessoas já usaram nos trabalhos delas, então você tá fazendo algo bem ruim. Repetição nunca foi um problema na arte, pelo contrário. Na grande maioria das vezes, o que torna um trabalho interessante é o jogo que ele é capaz de promover com elementos que diferentes pessoas podem encontrar na sua composição.
No meu caso, apesar dessa estranha frustração, era óbvio que o uso que a história de “Nossa parte de noite” é muito diferente do que eu escrevo. Mas, eu espero poder assimilar alguns elementos desse e de todos os livros que eu considero bem escritos, de todos os trabalhos de arte que eu considero bem-feitos.
Hoje, eu consigo lidar bem com esse tipo de frustração. Parte desse “lidar bem” passa pela compreensão de que as cobranças e auto-cobranças burras pela originalidade vão continuar a fazer parte do mundo da arte por muito tempo. Quem segue essa lógica e se rende a esse tipo de cobrança, não sai do lugar. Isso é uma das muitas armadilhas do mundo da arte.
Isso se parece muito com… não sei muito bem como dizer. Isso me parece com uma coisa que eu acho muito triste, e que eu acho que vai sempre fazer parte de mim, por mais que eu lute contra.
Quando você é muito pobre, qualquer pequeno mimo se reveste de significados muito densos. Se você ganha ou consegue comprar uma roupa nova, se vai ter uma comida gostosa nas refeições daquele semana, se tem um prato mais bonito no meio da louça arranhada, um batom que sobrou da última vez que você pode comprar maquiagem, um anel antigo de família, que sobreviveu à penhora… você quer guardar aquilo. Você quer preservar aquela coisa e só usá-la em momentos muito especiais.
Isso gera dois problemas muito tristes.
O primeiro, é que as ocasiões especiais podem nunca aparecer. E daí, o que acontece é: a roupa nova fica velha sem ser usada; a comida gostosa estraga porque você resolver comer só um pouquinho de cada vez, pra durar mais; o prato bonito se quebra sem ter nunca sido usado; o batom vai vencer; o anel antigo vai ficar esquecido no fundo de uma caixa, você vai morrer, seus netos vão pegar aquele anel, vão achar feio e jogar de volta na caixa.
O segundo problema triste, é que, quando você se perde no meio dessa espera por ocasiões especiais e na escassez de coisas boas, bonitas e novas, você pode nem perceber que o mundo a sua volta mudou. Você pode nem perceber que tem várias outras coisas que você poderia valorizar.
Teve uma época, quando meu pai já tava idoso e minha família já não estava mais na miséria há alguns anos, que ele começou a juntar um monte de bonés. Era boné de todo o tipo, desde aqueles promocionais de supermercados e cooperativas, passando pelos bonés de políticos, até os bonés com marcas bordadas, que meu irmão mais velho dava pra ele. Era só um monte de boné acumulado. Mas, ele continuava a usar sempre os mesmos bonés surrados e sujos.
A gente já tinha dinheiro pra comprar roupa nova. Não precisava mais usar roupa velha até ela se desfazer no corpo. Aqueles bonés não iam ficar pra outras pessoas, igual as roupas dos meus irmãos mais velhos ficavam pra mim.
Quando meu irmão insistia pra ele usar os bonés novos. Ele dizia que estava guardando pra alguma ocasião especial.
Eram bonés de supermercados locais, de cooperativas, bonés genéricos comprados no camelô. E é óbvio que nunca teve nenhuma ocasião especial, no nível que ele esperava, em que ele fosse usar os bonés limpos e novos.
Anos depois, quando ele morreu, eu ainda encontrei alguns bonés perdidos no meio das roupas dele. Limpos, quase novos.
Pra mim, pelo menos, essas duas coisas estão ligadas, quando eu falo sobre esse sentimento estranho de frustração.
Então, pra encerrar esse episódio, eu decidi fazer a leitura de um conto que eu publiquei no jornal Jamburana, o tremor literário, no começo do ano.
Além de se relacionar um pouco com o assunto direito do episódio, tem outro motivo pra eu querer ler esse conto. Acontece que essa é uma das muitas histórias que eu escrevi pensando nesse, entre aspas e com iniciais maiúsculas, “Outro Lugar”. Quem sabe, ano que vem, eu não crie coragem pra publicar uma história mais longa, desse conjunto de textos que é tão especial pra mim. Daí, enfim, eu vou poder tirar essa velha roupa nova do armário.
Circular mares e morros
Viviane nunca acreditou que passaria pelo drama de perder tudo e rastejar para a sua cidade natal. Sua cidade. Expressão sem sentido. Aquele lugar não lhe pertencia e ela jamais se deixou possuir por sua miséria poeirenta. Pegar o trem de volta era uma humilhação sem tamanho. Não sabia se sobreviveria ao peso do fracasso. Por isso, uma pressão esperançosa apertou seu coração quando os freios chiaram e os vagões pararam no meio da noite.
O trem Vitória-Minas partia de Cariacica, cidade mais pobre da região metropolitana, e atravessava os mares de morros em um serpentear lento e barato. Depois que os vagões de passageiros foram reformados, ninguém mais precisava preocupar-se em ficar coberto de pó de minério. Ar-condicionado e poltronas confortáveis ajudavam no cochilo inevitável para a viagem de treze horas. Essa duração dependia das condições. Se tudo saísse como o planejado, o trem partia de manhã e chegava no começo da noite.
Um carro quebrado entre as estações de Fundão e Aricanga e uma senhora que precisou ser levada pela ambulância em Piraqueaçu foi o suficiente para atrasar em mais de cinco horas a previsão de chegada em Belo Horizonte. Viviane nem sabia em que ponto estavam. De um lado, a silhueta dos morros marcava o céu iluminado pela lua crescente. Do outro, os reflexos nas ondas de uma lagoa espelhavam o voo acelerado das nuvens brancas.
O desgaste já havia cansado as outras pessoas no vagão e ninguém se prestou a acordar. Roncos baixos, roçar de cobertores, gemidos assustados de criança em pesadelo. Com o atraso, talvez chegassem ao destino só pela manhã. Seria mais fácil pra pegar um ônibus. Pagar carro na madrugada estava fora de cogitação.
Viviane já havia desistido de pagar as dívidas dos cartões e empréstimos. Poucas notas na carteira, roupas na mochila, celular na bolsa, pasta de documentos e uns fios brancos de dignidade na cabeça. Quando saiu da casa da família, logo depois de fazer dezoito, ela tinha bem menos que isso.
Ela não queria conhecer o mundo inteiro nem ficar rica. Viviane contentava-se em não ficar parada. Foram tempos elétricos. Pensões, faxina, amigas, caixa de mercado, dor na lombar, cursinho de matemática financeira, atendimento ao cliente, informática, inglês instrumental, loja de tecidos, de calçados, de eletrônica, lanchonete, restaurante, mais faxina, namorado branco, casa de família de juiz, copeira no fórum, encarregada de serviços, traição, curso de teatro, contabilidade, recepcionista na prefeitura, troca de governo, empresa obscura que separava documentos para licitações, perseguição do chefe, pernas quebradas, doença renal, inflação, INSS negado, amiga morta, homem novo, homem velho, aluguel atrasado, poupança seca, cheque especial, alucinações, assalto, sem faxina, inundações, desaparecimentos, móveis vendidos, perda de peso, choro, despejo, abrigo da prefeitura, trem.
Viviane não era uma pessoa orgulhosa. Só não queria atravessar as montanhas rumo ao interior porque era como se isso estrangulasse seus sonhos. As pessoas daquela cidade continuariam odiosas e a tratariam como algo sujo e inferior. Mas, isso não era o pior. Retornar através das montanhas significava abrir mão da esperança, do sorriso, do tesão e da vontade de criar um dia novo. Era como deixar de fazer parte do mundo real.
Ainda que já tivesse começado a duvidar de sua sanidade, era aquele buraco esquecido nos vales de Minas que a fazia sentir-se alijada da realidade. Poderia conviver com as alucinações que a afligiam nos últimos meses. Nenhuma daquelas sombras vivas, bichos brilhantes e vozes nebulosas tentara lhe fazer mal.
Quem sabe aquela terceira parada do trem fosse a sua última chance de mudar de ideia. Tanta gente diz que são as raízes que nos sustentam. Mas, para Viviane, essa máxima não funcionava. No mínimo, era uma ideia que precisava ser interpretada com maior liberdade. O primeiro chão que suas raízes conheceram era podre e quase a impediu de florescer.
Talvez ela até preferisse não se comparar com uma planta. Preferia o ciclo da água. Evaporar. Chover sobre a Mata Atlântica e escorrer pela terra. Seguir para o encontro com suas memórias de infância nunca deveria ter sido uma opção. Mas, depois que as rodas de metal giraram sobre os trilhos, dar meia-volta para o litoral também seria uma espécie de retorno.
Com a conclusão de que não se obrigaria a seguir em nenhuma daquelas direções, Viviane reparou no som distante. A coisa vinha lá de depois da curva, onde os vagões já se perdiam na escuridão. O barulho crescia e lembrava sacolas plásticas ao vento. Centenas ou milhares de sacolas plásticas. Aquilo aproximava-se em um ritmo constante.
Como todas as pessoas continuavam a dormir, só pode concluir que se tratava de mais uma alucinação. Dessa vez, no entanto, sua imaginação havia extrapolado os limites. Surgida do meio da mata, na outra margem da lagoa, a criatura era maior do que o trem. Um elefante sem pernas, esticado e elástico. Uma lagarta lilás, rechonchuda e apressada. As ondulações do corpanzil a jogavam para frente e acompanhavam a margem da lagoa sem tocar na água. Viviane só despertou de seu quase transe quando a coisa roçou em uma grande Cambuci e fez cair frutos e folhas.
Já não fazia diferença se as pessoas continuavam em seus sonhos. Poderiam viver suas fantasias durante o sono. Ela permaneceria acordada para não perder as melhores partes. Sempre haveria medo, mas esse seria um companheiro, não o seu dono.
Sem desespero e apenas com a pressa necessária para não perder o seu ponto de desembarque, Viviane pegou a mochila, ajeitou a bolsa e as muletas e cortou o corredor do vagão até os fundos. Demorou mais do que esperava para encontrar a trava da porta lateral. Quando conseguiu deslizá-la, a lufada de ar quente e úmido a abraçou e trouxe os sons da chegada da criatura.
Depois da pequena escadinha de saída, havia quase um metro e meio de cascalho inclinado. Viviane sentou-se no último degrau, jogou as muletas e a mochila para fora e deixou o corpo deslizar pelas pedras cinzas. A poeira ergueu-se como uma nuvem cintilante. Viviane precisou recuperar-se da tosse e, quando conseguiu erguer-se, percebeu o silêncio.
Ao lado do vagão, a poucos metros de distância, a coisa mostrava sua dimensão. Se decidisse, poderia virar o trem com um chacoalhar dos filamentos de seu corpo semitransparente. Viviane quis encará-la, mas não encontrou olhos e nem sabia se havia um rosto no que decidiu chamar de cabeça. A lagartona parecia indecisa diante de sua observadora revelada.
Redemoinhos furta-cor agitavam-se por toda a superfície da cabeça e perdiam-se na direção dos filamentos, que se tornavam mais largos na medida em que se afastavam para a calda. Não havia pernas. Um sem-número de fios azuis dançava sob aquele grande verme fantasma.
Viviane tremia, mas não de horror. Ao perceber que a coisa voltou a mover-se e a atingiria, atravessaria ou engoliria, ela teve certeza de que seu mundo havia mudado. Nos extremos entre aquele corpo impossível e o ambiente abafado de final de novembro, o ar parecia estar distorcido, como se fosse líquido.
Quanto mais próxima do toque, mais nítido se tornava o caminho sem trilhos dos desejos que sempre se forçara a ignorar, adiar ou não compreender. Nunca seria suficiente pular de cidade em cidade, de estado em estado. Sua inquietação não era a ânsia por fincar raízes ou curar as relações com o chão de onde brotara. A transformação pela qual precisava passar seria uma abençoada perdição.
Não houve toque. Algo muito além da dor da libertação fez explodir o grito agudo que ecoou para a mata, pelos morros e pelo céu enluarado. As roupas viraram pó. A pele de Viviane subiu em minúsculas gotas, seguidas dos seus músculos, tendões, sangue e até ossos. Sua voz sumiu com seu rosto.
Na curva seguinte, a criatura desapareceu para dentro da mata. O vapor em que Viviane se transformou subiu e voou sobre os morros, misturou-se com as nuvens, mas não perdeu o desejo de descer para a terra e conhecer todas as raízes.
Encerramento
Taí! Encerrando mais um Não Pod Chorar. Gostou? Não Gostou? Fala com a gente. Você pode entrar em contato com a gente através do nosso e-mail, que é naopodtocar@gmail.com, ou dos nossos perfis pessoais e oficiais, que estão todos linkados na descrição completa deste episódio, na postagem original, em notamanuscrita.com.
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Por hoje é isso, se nada der muito, mas muito, muito errado, semana que vem, a gente tá de volta. Valeu! Falou!
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