[texto de processo] Meus olhos viraram uma cybershot

Imagem de capa. Fotografia. Arte e tecnologia.

Rodrigo Hipólito. A coisa apresentada expulsa o criador. Rotina de imagens falsas, 10.07.2012. Fotografia digital em baixa resolução. Céu azul claro com nuvens amareladas por detrás de uma tela quadriculada semitransparente, com poste de iluminação pública no canto espero inferior.

Duas ou mais paisagens. Na rotina de acordar todos os dias (atividade por demais cansativa e executada com grau de sofrimento variado) pede algumas atenções. Vários planos sucedem-se diante dos olhos e coordená-los de maneiras inteligíveis nem sempre é possível. A incidência de luz no plano do vidro é embaralhada. Confusão irritante. Na metade que escapa, fica a impressão mais escorregadia. De imediato, o chão não se faz. Imaginar a duplicação de um panorama é o mais aproximado do esforço de colocar o olhar num adiante-horizonte repetindo-se como animação precária.

Pronuncie calma e mantricamente: isso não é uma televisão. Caso não adiante, arremesse objetos pesados e inúteis. Quanto mais próximo do orgânico melhor, talvez pessoas ou cães funcionem muito bem pelo estardalhaço pós-queda. Tente atingir a maldita tela. Do contrário, pode acabar incluído no casting de um filme policial classe B, num daqueles cenários cinza-tristes de subúrbio-galpão, num estacionamento de lanchonete com rapazes vadiando de bicicleta, próximos da quadra de esportes sem alambrado. Esta é umas das piores perspectivas que se é capaz de conceber diante da superficialização da realidade palpável. Tudo que se apresenta na atualidade é transparente, já que nada existe do outro lado.

O desespero de acreditar que aquilo não é um cenário maltrata a carne do mundo como nunca se viu.

Meus olhos viraram uma cybershot.

Abaixar as pálpebras assusta, causa tremores. É que os registros não possuem tempo de visualização programado e não é possível resgatar livremente essas malditas captações. Elas virão automaticamente nas reações do programa: dê um acorde e a canção é seguida com descompasso grosseiro, risque o giz no quadro e um turbilhão de pedidos aparece no canto esquerdo da retina.

A vontade maior é enxergar a cadeira como é uma cadeira, o queijo como é um queijo, e ter pela superfície da mesa primeiro uma coisa que sustenta outra coisa. Mesmo pisar o chão sem a crença palpitante de que, ao errar o passo, você vai começar a voar, tornou-se missão hercúlea em perseguição vigiada (filmada e divulgada).

A estranheza da minha “era das imagens” particular é que não sou feito de papel. Essa coisa de formular-se como um ser espiritual, jamais terá lugar no mundo dissolvido em desinformações. Sabe aquele esforço de fazer de tudo uma janela? Ele continuou e parece ser muito bem-sucedido. Só deram com o pé numa perspectiva aqui, numa abstração ali, até que se mostrasse possível o cálculo necessário para dissipar a consciência na concretude de que toda a redundância é coisa nova, sem vontade nem movimento. Afinal, que seria melhor entre rezar e trabalhar?

Pare de olhar, respire, olhe de novo, depois tente tocar, pois todo esse mundo é feito de grandes curiosidades.

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