Texto de Fabiana Pedroni
Xiiuuu, só… Escute. Acho que é uma ciriema, chamando chuva. Está tudo tão cinza, tão cheio de concreto, mas a menina, que vaga pelo estacionamento sem destino certo, ainda consegue ouvir o canto. Se eu não a conhecesse há muito tempo, diria que está mais ansiosa que o normal. Certamente não conseguia acreditar que uma ciriema viria neste dia tão estranho cantar para as nuvens. Aposto que… Sim, nem precisei apostar. Ela vai andar de um lado para o outro até encontra o pássaro e atrapalhar todo o encanto.
Sente-se debaixo daquela árvore, descanse as pernas, endireite a coluna. A ciriema não vai aparecer tão rápido, é arisca. Espere neste banco, converse sobre nada. Encoste, sinta o calor da outra mão que toca o banco, passe um tempo sem se preocupar. Um bom conselho, mas mesmo quando o corpo se move, não sei bem se ela me escuta. A silhueta da ciriema até apareceu entre um carro e outro, mas o canto, só viria da penumbra. Nesse esconde e não esconde, ela cedeu ao tempo. Os corpos na madeira do banco pareciam criar raízes e não querer levantar. Foi um bom conselho. E poético demais. Madamezinha acharia estranho criar poesia em madeira morta embaixo de uma árvore de madeira viva, mas acontece. Somos seres irônicos, e um pouco tediosos. Com uma ciriema agora já distante a cantar, o calor da árvore e do abraço, parece que ela conseguiu parar de pensar. Mas para garantir, deixarei uma memória em seu bolso, que a agarrará para lembrar-se de que ninguém é produtivo quando cansado. E que ela bem sabe que para descansar, precisa de mato, de ciriema, de silêncio.
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E, às vezes, de escrever textos bobos.