Texto de Fabiana Pedroni
[Nota do editor: encontrei esse fragmento perdido entre as pastas de “textos a publicar”. Deixei o arquivo de lado por meses. Estava quase certo de que já tínhamos publicado uma versão. Demorei para voltar à pasta, pois seria necessário fazer uma pesquisa atenta nas centenas de postagens do site. Parece simples, mas, nós mudamos muitos títulos e palavras-chave de última hora. Isso dificulta um pouco as buscas. Além disso, inserimos textos em imagens. Quando se trata de postagens mais antigas, a coisa fica ainda mais complicada, já que faltavam descrições corretas das imagens. Parei para fazer essa busca hoje, 16 de maio de 2023, quase três anos depois da data em que esse fragmento foi escrito. Verifiquei que minha memória estava, em parte, correta. Junto do fragmento, constava um texto datilografado. Esse texto, sim, foi publicado, por Fabiana, como [texto de processo] A escrita como processo do presente, em 21 de abril de 2020. Imagino que ela tenha começado a redigir uma continuação do texto de processo ou, mais provável, que a data indicada no fragmento esteja errada. Pensei em perguntar. Afinal, ela é a autora. Mas, isso poderia gerar mais trabalho de edição e criaria uma contradição com o próprio conteúdo do fragmento (logo, você vai perceber). No fim das contas, se eu voltei à pasta de “textos a publicar”, foi por não ter encontrado nenhuma indicação, na agenda de publicações, para o dia de hoje. É bem desagradável tentar escrever uma crônica de última hora, sem vontade. Quando isso acontece, meu processo de desbloqueio envolve retornar aos meus variados arquivos de “Possíveis histórias”, “Anotações para esquecer”, “Rascunhos”, “Abandonados”, “Notas para”. Quase sempre, funciona.]

Fotografia de caderno de anotações com emaranhado de palavras manuscritas sobrepostas.
30 de agosto de 2020
Sente-se diante do computador, abra seu arquivo em branco e jure que, assim como eu, conseguiremos registrar neste A4 virtual todos os pensamentos que se embaralham na mente. Sinta, comigo, a frustração do “praticamente nada acontece, nada”. Bloqueio criativo, bloqueio de escrita, podemos dar todos os nomes possíveis, mas nada faria o gato parar de embolar as linhas. A escrita toma corpo, acontece, quando as letras se ordenam e juntas fornecem uma gama determinada de sentidos, mas as minhas letras brigam entre si e nenhuma quer ir para a folha. Quando vão, é apenas para evidenciar meu inútil esforço em definir sua existência e como a escrita acontece, pois elas podem, as letras, querer ser corpo, querer ser imagem, querer ser acontecimento e não se importar tanto com os significados que eu busco.
Cada tipo de trabalho exige diferentes estratégias de desbloqueio. Se preciso de um desenho, faço hachuras aleatórias até concentrar-me em uma forma e em uma ideia mais definida; se preciso de uma pintura ou outro trabalho relacionado a cores, penso enquanto lavo pincéis em ritmo musical, ou faço malabarismos desastrosos com as ferramentas; se preciso de um título, faço listas:
– Listo palavras-chave que se relacionam ao conteúdo do objeto:
– texto.
– imagem.
– ação.
– Listo objetos.
– Listo coisas a fazer.
– Listo coisas que gostaria de fazer.
– Volto para o título com alguns desejos.
Às vezes, não adianta fazer hachuras, malabares, listas, passeios, danças, preces. muito menos ficar presa num processo que evidencia a maravilha que é a tecnologia do escreve-apaga do word (ou google docs). Sem rasuras, sem restos de borracha, sem manchas. Pensar sobre o processo pode ser mais uma chave para desbloqueio.
Os pensamentos se atropelam justamente porque tenho em mente, nesse caso específico, um ponto de partida não tão usual: o título; E todo o emaranhado daquilo que quero dizer e que atravessa o corpo do título a todo instante. Penso o processo por sistemas, por mapas mentais cheios de balões, linhas, setas de conexões. Mas, o corpo do texto só surgiria depois de sentir, com o tato, o próprio corpo.
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