
Imagem de capa. Recorte da capa do livro “Estrellas Rotas”. Fundo escuro com imagem de céu estrelado com nebulosas sobre o qual está escrito o título do livro em caracteres chineses simplificados.
Estrellas rotas: II antología de ciencia ficción china contemporánea (ed. Ken Liu. trad. María Pilar San Román). Autores: Xia Jia, Liu Cixin, Tang Fei, Han Song, Cheng Jingbo, Baoshu, Hao Jingfang, Fei Dao, Zhang Ran, Anna Wu, Ma Boyong, Gu Shi, Regina Kanyu Wang, Chen Qiufan. Alianza Editorial, 2020.
Texto de Rodrigo Hipólito
Durante o último ano, muito por conta dos diálogos estabelecidos para as gravações do Pindorama e das mesas do festival Relampeio e da FutureCon, me dei conta de que nunca havia lido ficção científica chinesa. Estrellas rotas é o meu primeiro contato com literatura chinesa, não apenas de ficção científica. Em parte, não posso ignorar que essa demora se deu tanto por distância e ignorância da minha parte, quanto pela ausência de traduções.
Mesmo para o inglês, ainda há poucas traduções de narrativas recentes produzidas na China e, quando falamos de ficção científica, esse problema fica mais nítido. Revistas da área têm feito esse esforço e contos, noveletas e romances chineses venceram uma penca de prêmios nos últimos anos. Em grande medida isso é fruto do trabalho de profissionais independentes e, ainda mais, de autores e autoras.
Não sou um bom leitor em inglês. Felizmente, quando uma obra alcança relativo sucesso em inglês, as traduções para o espanhol não tardam.
Estrellas rotas é a segunda antologia de ficção científica editada por Ken Liu. A primeira foi Planetas invisibles (Alianza Editoral, 2017. Trad. Manuel de los Reyes & David Tejera Expósito). Por que eu comecei pelo segundo volume? Porque eu me confundi. Tudo bem! Pretendo ler Planetas Invisibles logo.
Isso significa que me dei bem com todos os textos de Estrellas rotas e que foi uma leitura fácil? Não.
Fiquei travado em alguns contos e noveletas e, por vezes, a distância cultural fez diferença. Não poderia esperar menos. Mas, isso não vou tão relevante. Fico com a impressão de que esse conjunto de textos é feito (também) para causar esse efeito. Não se trata apenas de passar a gostar do que é produzido em literatura de ficção científica na China, mas de perceber sua variedade sem assustar (muito).
Alguns textos, para serem fluídos com leveza, dependem de um conhecimento sobre a história chinesa que, majoritariamente, esse lado do globo não possui. Esse é o caso de “Los juegos del Primer Emperador”, de Ma Boyong, e “Bajo una luz más halagüeña lo que ha pasado verás”, de Baoshu. Este segundo relato foi um dos que mais me impactou e uma das leituras mais difíceis.
Baoshu constrói uma estranha ficção histórica que repassa o século XX chinês e mexe com as nossas impressões sobre cenários e acontecimentos que, mesmo distantes, nos são (minimamente) conhecidos. Não é uma história feliz (detesto histórias tristes) e, no final, fica a impressão de ter caminhado uns cem anos em algumas páginas. É uma narrativa que nos deixa sem escapatória e que alicerçou boa parte das leituras seguintes.
Não que a angústia e a tristeza sejam sentimentos dominantes no conjunto de narrativas. Pelo contrário, talvez haja mais bom humor do que eu tenha sido capaz de perceber. Algumas narrativas explicitam esse bom humor, como “El robot al que le gustaba contar trolas”, de de Fei Dao, “El tren de Año Nuevo”, de Hao Jingfang, e “Historia de las enfermedades futuras”, de Chen Qiufan. Dessas, a última me fez imaginar um ótimo conjunto de esquetes.
Não poderia deixar de citar duas narrativas de Han Song, “Submarinos” e “Salinger y los coreanos”. Ambas as histórias conseguem realizar a mistura daqueles elementos angustiantes e desalentadores com pontos de vista que podem deixar um sorriso meio amargo na boca. De todo o livro “Submarinos” e “Bajo una luz más halagüeña lo que ha pasado verás” talvez sejam as duas narrativas que mais me marcaram e que eu pinçaria com indicação de “por onde começar”.
Não sei bem o motivo, mas, de alguma maneira, depois dessa leitura, me parece que foi o caminho certo começar por um segundo volume e, depois, partir para o primeiro. Fiquei com essa impressão de pois de ler os ensaios que fecham a antologia. Esses três textos “Breve introducción a la ciencia-ficción y al fandom chinos”, de Regina Kanyu Wang, “Un nuevo continente para los académicos chinos: el estudio de la ciencia-ficción”, de Ming Song, e “Ciencia-ficción: se acabó el avergonzarse”, de Fei Dao, podem ser o primeiro passo para quem, assim como eu, desconhecia por completo todo esse universo da ficção científica.
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